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quinta-feira, 7 de novembro de 2013

O que é cultura - um exercício jornalístico

O que é cultura?

Começaremos nosso texto a partir de duas frases coletadas de depoimentos de duas pessoas indagadas a definirem o termo cultura apenas com base em seu acervo pessoal, sem qualquer consulta outra ou a diverso mecanismo de informação.
Cultura são os conjuntos de crenças e tradições que as pessoas têm. (mulher)
Cultura é uma arte desenvolvida por um grupo de pessoas de uma determinada região relacionada a costumes. É um patrimônio de conhecimento e ações de pessoas ou por regiões. (homem)
Notamos que para a mulher, a noção de cultura apresentada foi aquela mais simples e ligada aos elementos tradicionalmente evocados numa pergunta “à queima-roupa”: a lembrança das crenças e tradições denota a ligação com o passado, com o elemento anterior que se prolonga através das gerações via mediações e herança cultural.
Já no caso do homem, pode-se entender que houve um pendor mais acentuado ao âmbito do artístico, do folclórico – enquanto saber artístico de um povo dimensionado em uma época e num local – em muito referenciado ao elo da preservação de bens seja materiais e/ou imateriais no que diz respeito a patrimônio de um povo, uma população.
Aí temos exemplos clássicos de definição de cultura que têm por base as lições aprendidas em casa, as aulas escolares, nas quais o que mais se releva no tocante a definição do termo cultura é mesmo essa ligação ou linkagem com hábitos, atos e modos de viver do passado que por sua importância sócio-histórica foram transmitidos às outras gerações que foram vindo até os dias de hoje.
Exatamente neste ponto começam a tomar forma as inextrincáveis relações entre cultura e comunicação, como diz Lúcia Santaella. Pois, desde uma urna funerária achada em um sítio arqueológico até as novas fronteiras do universo humanamente conhecível representam muito bem esta relação.
Para seguir a linha de raciocínio: se para mim uma entrevista radiofônica, uma reportagem televisiva, uma capa de revista, um suplemento de um jornal impresso, a página principal de um sítio web... enfim, são elementos de cultura porque estou inserido neste nicho prfissional e é neste meio em que vivencio as minhas experiências com as pessoas tomadas individual ou coletivamente, temporal ou espacialmente, para um voyer ou um flaneur – por exemplos, as experiências que mais o interessariam culturalmente em muito diferem das minhas, posto seu distinto papel ou atitude ética ou social.
Mais: Se para mim um documentário etnográfico – que levou meses da concepção e do storyboard até a finalização e a distribuição – é um produto da cultura, para um eremita que escolheu viver num mosteiro isso não é cultura; pois para ele cultura é dedicar-se a liturgias, artes e ofícios sacros.
Gostaria de adicionar aqui um exemplo incrível que me surgiu no meio da reflexão sobre este próprio texto e que vai ser a minha resposta atual para a pergunta “O que é cultura?”. Falarei Do traje e dos modos do jornalista universitário. Quanta carga de conteúdo e quanto discursivo texto (em sentido lato) há nessa perspectiva de análise! Pois, senão, pensemos: Quando o jornalista acorda ele já inicia seu trabalho, já está atento e planejando a agenda do dia de cobertura.
Segundo os manuais e livros de etiqueta jornalística, a indumentária deveria ser o máximo possível neutra, social, limpa e arrumada. O mesmo se aplicando a cabelo, barba, unhas, adereços, etc. Mas então, como é que o jornalista poderá lidar com seus entrevistados tão díspares e diversos ao longo do dia de trabalho, sempre com o mesmo uniforme ou “farda”? Ele não poderá, suponhamos, ir à reunião do Conselho Departamental ou com a Reitoria da Universidade de camiseta, calça surrada rasgada, chinelos por exemplo. Mas tampouco não poderíamos compreendê-lo ir a uma manifestação estudantil do DCE indo de casaco, terno, mocassins lustrosos, gravata de cetim e outros adereços de luxo.
Isto representa, enquanto choque cultural, a diferenciação em crise de valores informais e formais com os quais o jornalista tem de lidar cotidianamente, hoje e talvez sempre. Então, opta-se por um meio termo: nem de mais informal, nem de menos formal – mediano: jeans luxo, camisa social sport fino, sapatenis e por aí vai.

Quero concluir a dizer que acredito que a cultura é a própria comunicação posta em movimento nas dimensões de tempo, de espaço, de linguagem, de povo ou grupamento humano. Para mim, quem define mesmo o que é a cultura somos nós, identidade cultural plural, povo, nação, regionalidade, localidade, através de nossas criatividades e estalos de ideias que surpreendem alguém agora e amanhã – através da mídia – a muito mais gente.

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